6451-10 Term. Bandeira - Term. Capelinha
“Moça, se você quer ir pra um lugar longe, pode pegar o ‘Capelinha’”, indicou a funcionária do Terminal Bandeira. Entre os corredores do Terminal, um letreiro de alumínio indica o destino aos transeuntes. 13h07 o ônibus ligou seu motor e os últimos passageiros correram para pegar o expresso rumo ao distrito de Campo Limpo, zona Sudoeste de São Paulo. Era um sábado de clima confuso para os paulistas, nublado e frio. Tão confuso e misto quanto o cenário do trajeto, que de início passou pelos arranha-céus do centro do capital financeiro da cidade, no cruzamento da avenida Nove de Julho com a Faria Lima, até chegarmos em uma paisagem de mata da Estrada de Itapecerica, próximo ao ponto final do ônibus.
A viagem no ônibus “6451-10 Term. Bandeira - Term. Capelinha” durou 50 minutos, com pouco engarrafamento. Durante a semana, os ônibus desse trajeto demoram, muitas das vezes, meia hora a mais. Assim como os trabalhadores, que tardam para chegar em suas casas utilizando a mesma linha, segundo o tempo estimado pelo Google Maps. No geral, de acordo com a Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes, as linhas da zona Oeste e Sul, mais especificamente Butantã e Campo Limpo, possuem o maior tempo médio de percurso, totalizando, do bairro ao centro, 82 minutos, e o caminho inverso, 66 minutos de trajeto.
Naquele sábado, o movimento no Terminal Capelinha era maior do que no Bandeira, com filas extensas e grande movimentação de ônibus saindo e entrando. A demanda na região é grande - o distrito de Campo Limpo possui a 12º maior população da cidade de São Paulo, com 222.301 habitantes. Capão Redondo, seu vizinho, ocupa o 4º lugar com 285.580 habitantes (SEADE 2016). Próxima de bairros valorizados da capital paulista como Moema e Morumbi, a região atraiu pessoas que trabalham nesses locais.
Para conhecer os usuários do Capelinha, a reportagem entrevistou 3 pessoas que estavam no terminal naquele sábado.
VOZES DO CAPELINHA
Sentada em um dos bancos do terminal, Maria Socorro Araújo, 67, já esperava há um bom tempo o ônibus “6826-10 Jd. D. José” para chegar a sua casa. Para ela, sábado não era dia de descanso. Há 13 anos ela trabalha como empregada doméstica seis dias por semana em uma casa no Itaim Bibi.
De segunda a sábado, sem pausas, ela se desloca do Capão Redondo, lugar que mora há mais de 20 anos, para o bairro paulistano. Acorda às 4h20, pega um ônibus até o terminal Capelinha e aguarda o segundo ônibus “bem lotado”, aponta. Para, enfim, chegar às 6h30 da manhã em seu trabalho.
Enquanto olha atenta o movimento do terminal, Maria Socorro relembra algumas histórias que viveu em São Paulo, como quando conheceu seu ex-marido. “Trabalhava na Av. Brasil, ele era do Mato Grosso e eu do Rio Grande do Norte”.
Se pudesse melhorar alguma coisa da região onde vive, ela escolheria a saúde. “A saúde podia melhorar. Não tenho convênio, só cartão do SUS. É um sofrimento.” De fato, Capão Redondo está entre os distritos com maior índice de necessidades em saúde segundo dados divulgados em 2010 pela Prefeitura de São Paulo. Entre os indicadores avaliados estão a taxa de mortalidade, incidência de doenças infectocontagiosas e qualidade das gestações.
Assim como Maria Socorro, Henrique Martins, 19, não estava a passeio. Atendente há três meses em uma pizzaria de Moema, o jovem trabalha de domingo a domingo.
Um dos seus sonhos é terminar o colegial e entrar na universidade. “Sempre quis fazer Educação Física, mas um parceiro me disse que Administração dá dinheiro”, conta.
O secundarista vive há oito anos no Parque Fernanda, bairro vizinho de Capão Redondo. Ele alerta para quantidade de roubos no local, mas não pensa em se mudar da região, já que sua família e amigos vivem lá.
Vanda Eduarda, 52 anos, dona de casa mora no Jardim Vera Cruz, um dos bairros da região Oeste. Naquele sábado, se deslocou até o terminal capelinha para visitar a irmã que acabara de fazer uma cirurgia no Jardim Jacira, localizado em Itapecerica da Serra.
Para Vanda, a região central de São Paulo é vista como um lugar distante. “Não vou muito para aqueles lados lá, raramente vou pra Santo Amaro até.” Sobre um aspecto de seu bairro que mudaria, ela escolhe a educação como área que precisa de mais investimentos.
O terminal Capelinha foi inaugurado em 1998 pelo prefeito Celso Pitta, do PPB (Partido Progressista Brasileiro). Ao todo, são 43 linhas, diurnas e noturnas, que saem do Terminal Capelinha. Onde o metrô não chega, as linhas de ônibus levam a população da zona Sul e da extrema zona Sul até a região central.
COMO A ZONA SUL É VISTA
A percepção do que é a região central é diferente de acordo com os moradores de cada região. O ponto referencial muda. Enquanto a funcionária do Terminal Bandeira indicava como exemplo que um lugar longe era a região sul, quem mora na região sul dificilmente demonstra vontade de ir para “aqueles lados” do centro, como afirmou a morada Vanda.
Enquanto estávamos no Terminal Capelinha, éramos vistas como estrangeiras. Os funcionários do Terminal, intrigados com a nossa presença, nos questionaram diversas vezes: “o que estão fazendo aqui? o que querem?” parecia estranha a ideia de desnaturalizar aquele espaço. Os moradores, também, se mostravam apreensivos com a nossa presença. Enquanto anotávamos, muitos desconfiavam dos bloquinhos.
Nos últimos momentos que estávamos no Terminal, um grupo de funcionários nos proibiu de entrevistar as pessoas. “Por favor, peço para que se retirem”, nos disseram enquanto nos acompanhavam até o ônibus que nos levaria de volta. Dessa vez, para o metrô vila mariana.
Como já mostrou a equipe de reportagem do “UOL Tab”, o processo de gentrificação de uma região também acontece de forma constante. A própria zona sul vem, com o passar dos anos, enfrentando esse processo. A gentrificação é a valorização de um bairro ou região. Os custos altos de vida, porém, extrapolam o que estava estabelecido antes com os outros moradores.
Reportagem do “Repórter Brasil” mostrou como esse conceito, o de gentrificação, afeta lugares distantes da zona central. E mostrando que o bairro do Campo Limpo, por exemplo, aumentou seu custo por metro quadrado de seu aluguel.